Wednesday, February 28, 2007

Sexta-feira, 8h da manhã

Foi até ao seu café habitual na esperança de a ver.
Pediu o habitual e enquanto mexia maquinalmente o seu café perfumado foi-se acostumando à ideia de que aquele lugar em frente dele iria permanecer vazio.
Acendeu o cigarro aspirando o seu sabor acre que se entranhava na parte de trás da sua língua, acamado pelo café que acabava de beber.
"Passam 10 minutos das 3, viu o Benfica ontem?" perguntava-lhe o empregado de balcão, familiarmente, enquanto esgrimia subtilmente as paixões de estar do outro lado da barricada. "Sim, ganhou bem." respondeu ele liminarmente enquanto mergulhava o seu olhar na chávena de café agora vazia. Hoje a conversa resumir-se-ia a este stacatto, habituados pela rotina, ambos sabiam intuitivamente como e quando continuar a conversa, na bipolaridade constante daquele cliente habitual.
Hoje não estava expansivo, preferia adivinhar o futuro nos desenhos que o açúcar residual deixava no fundo da chávena. O empregado de balcão adivinhou, preferindo arquitectar a equipa da próxima jornada na copa do café, em diálogo com os pratos sujos que sobraram do almoço.
Não, ela hoje não viria, habitualmente, como não veio nos 4 meses precedentes.
Hoje não haveria aquele jogo de xadrez composto de olhares cruzados. Ficou a saber que o sacrifício do seu bispo não conseguiu mais do que um xeque previsível à rainha. Outro peão tombou, mas aquele seria o último. Há jogos assim, que se jogam pelo prazer de jogar e não pelo resultado em si.
Lembrava-se de um desenho que fizera nas costas de um guardanapo, enquanto apreciava pelo canto do olho a perfeição daquela mão a poucos centímetros da sua. Os seus dedos eram compridos terminando numa unha bem cuidada, a sua pele era branca e muito lisa, desprovida daquelas rugas que circundam as articulações, inspirando-o a desenhar com meia dúzia de traços um paredão junto ao mar.
Porque o fazia? Talvez por desejar que a sua mão transpusesse esses poucos centímetros que a separavam dele, que a segurasse com força, uma força que não fosse fingida, e a conduzisse sem hesitação ou dúvida, a essa folha de papel. Demonstrar-lhe-ia que bastava essa convicção para anular o conceito papel, a palavra desenho, por sua mão ela sentiria não esse papel mas a areia da praia escorrendo pelos dedos, sentiria a sua pele arrepiar na água e contrair-se na rugosidade das pedras.
Como sempre fazia tirou esse papel desenhado do bolso, alisando-o à sua frente depois de desviar a chávena de café. Como sempre fazia o seu dedo deslizou ao de leve sobre a sua superfície.
Como sempre acontecia não foi o mar que sentiu mas sim a superfície áspera do papel e sob ele a lisura do granito.
Como sempre houve, há essa distância entre sonho e realidade, presente numa folha de papel.

Sunday, February 25, 2007

Milk It


Is better to burn fast than fade


Sinto-me deserto.
Já não preciso de o adivinhar no espelho, basta olhá-lo aqui no mapa da minha pele ou na angústia de uma folha em branco...
Não tenho motivo, ou mais do que isso, não tenho razão.
Não me prendem palavras, mas a sua criptografia confusa, são demasiadas e não chegam a ser suficientes.
Tenho de parar.

Tenho de dormir.


Tenho de decidir.

Não! Já está decídido, apenas tens de o compreender...

Apenas tens que dizer sim, e deixar ir...

Para longe de ti...

Para tão longe de ti...

Saturday, February 24, 2007

Novo Projecto


Juntei-me aos companheiros do costume, num novo projecto que espero vir a ser do agrado de quem vive e respira futebol!
Podem ver o resultado aqui:

de baliza aberta


Visitem e comentem!

Wednesday, February 21, 2007

Manif

Soube há poucos minutos que houve manifestação no alto tâmega por causa do encerramento ou requalificação das urgências nessa região.
Em primeiro lugar fiquei agradavelmente surpreendido por ver tal manifestação de intervenção cívica numa região que, pela distância geográfica, social e política ao resto do país, sempre assistiu com um certo desprezo e desalento às convulsões da república.
Agora falando verdade, o constante afastamento das funções sociais por parte deste e de outros governos tem um único culpado: o défice. Não me venham cá com histórias de que esta reorganização do SNS passa por medidas de racionalização da oferta existente, porque todos sabemos que ela é escassa, esbanjadora, corporativista e profundamente assimétrica. As medidas politicas que se tomam têm por último propósito o corte da despesa. O único critério seguido tem sido os tais 3% que por ser facilmente quantificável, leva grande vantagem sobre a qualidade e a utilidade das medidas propostas.
Sou flaviense dos quatro costados, nasci e cresci naquela terra, e como Miguel Torga, por muito mundo que veja é naquele pedaço de mundo agreste que eu encontro o meu lar. Já fui atendido naquela urgência, já lá fui operado, naquele Hospital nasceram e morreram pessoas que me foram muito queridas, mas não se enganem, se me coloco de alma e coração ao lado das pessoas que hoje se manifestaram não é só por todas as causas afectivas (que são muitas) mas também por conhecer a realidade dura de quem lá vive.
Não sou um desses especialistas que elaboram relatórios à la carte para ministros conscienciosos decidirem sobre a vida dos seus semelhantes, mas gostaria de lhes dizer que da aldeia de onde vim se demora perto de meia hora a chegar a Chaves isto quando o gelo na estrada é tanto que expande essa meia hora para uma inteira. Queria dizer-lhes que moram menos pessoas lá que na Amadora, em Sintra, em Valongo ou Ermesinde, mas que nem por isso deixam de ser menos pessoas ou menos dignas por isso. Queria dizer-lhes que não sou especialista mas que sei, e que até apostava se o assunto não fosse tão grave, que vão morrer pessoas cujo único pecado e causa de morte foi morarem longe de todos os centros de decisão, tão longe que a sua voz e morte não chegam a ecoar nas galerias da assembleia.
Há aí numa dessas leituras diárias do lado direito, uma que eu estimo particularmente no blog MentAcutilante. Lá se diz a propósito do Carnaval:

"Eu vou-me disfarçar de transmontana com igualdade de oportunidades, qualidade de ensino e acesso à cultura e ao desenvolvimento"

É que por notícias destas, cada vez mais me convenço que este disfarce, mais do que uma sátira, se está a transformar numa irrealidade ainda mais delirante que uma fatiota do lobisomem ou do homem-aranha.
Na notícia que vi, aparecia a dada altura um cartaz onde em letras garrafais se lia "se o norte dá assim tanta despesa, ofereçam-no aos Espanhóis". Aqui d'el Rei, que se trata de divisionismo contra a unidade da pátria, que escândalo já não nos faltava a Madeira agora aparecem os grunhos atrás do Marão a quererem migrar para Espanha. Mais uma vez não sou especialista, mas uma coisa vos digo, quem vive em Chaves vê que Espanha cresce quase 4% ao ano, lá não se criam 150000 postos de trabalho em 4 anos mas 550000 em apenas um, vêem melhor qualidade de vida, melhores salários, carros mais baratos, melhor saúde. E ao contrário dos iluminados que governam este país, ou os portugueses de direito que habitam em Lisboa, não vêem isso na televisão, basta olhar para o lado e a 10 Km de distância aparece o el dorado.
Sou bisneto de contrabandistas, de combatentes pela pátria que mataram alemães em La Lis, nos serões à volta da lareira, ainda me falam do tempo em que íamos a Espanha de noite para comprar chocolates e sabão ao preço da chuva, eu sou do tempo da internet e dos aviões, hoje vou a espanha atestar o depósito de gasolina e olhar com a cara parva e invejosa de um bom Português para a boa vida dos nossos vizinhos. Se tiver azar, enquanto regresso a Chaves, tenho um acidente de automóvel. Sou então um politraumatizado. Como antes de ser politraumatizado sou cidadão de segunda, espero 20 minutos por uma ambulância, mais 20 para chegar ao hospital (Distrital de Chaves, pois claro) para aí decidirem que não, tenho que ir para Vila Real, outra ambulância, mais 45 minutos e chego já cadáver. Pelo que sei e já vi, depois de morto já não importa seres Português, Espanhol ou Belga, parece que isso só importa enquanto estás vivo.



N.A.: a história que contei não é ficcional, há um par de anos atrás um amigo meu morreu nessa estrada que liga Chaves a Espanha. Revolta-me pensar que a esta tragédia pode ser ainda mais terrível se adicionarmos à equação a negação de cuidados de saúde condignas aos meus conterrâneos.

Sunday, February 18, 2007

Peeping D...

You should close your flight...

Há, em certos tempos, como este, uma calma que me aconchega de noite e me faz adormecer melhor.
São as palavras, talvez, as responsáveis, aquele resquício de humano que me toca pela sua simplicidade serena, histórias banais que se contam entre martinis depois de um jogo bem disputado... A simplicidade das coisas, um sorriso que se abre naquele apontamento mundano.
As noites também têm destas coisas, a noite é pródiga em elementos que, se combinados da maneira certa, nos devolvem à humanidade por inteiro, como se dela não saíssemos por um instante para mergulhar no nosso próprio mundinho...
Como naqueles quadros de Dali que eu sempre amei, encontro aqui dentro aquela irrealidade de formas, aquela selvajaria de conteúdos que me fazem vibrar e me apresentam o mundo não como ele é mas simplesmente como eu o desenho com as linhas da minha loucura... Outras vezes sou só eu, um gajo vestido de cinzento, cabelo negro e olhos castanhos, que se ri por tudo e por nada, que manda aquelas piadas certeiras, ácidas, inteligentes, aquele gajo que guarda os seus amigos e amigas como um tesouro valioso... sou apenas mais um.
E gosto de Martini, adoro música, leio e escrevo imenso, gosto de me entregar às coisas que significam algo para mim, gosto de poder ajudar, gosto do mar, do vento, do fogo e de café, cozinhar relaxa-me e adoro inventar, aprendi a ser independente, vivo sozinho à 5 anos, não trocava o meu puff pelo seu peso em ouro, tenho pauzinhos de incenso e umas 30 velas em casa, gosto do sol e de conhecer pessoas, tenho montes de recordações boas guardadas em arcas de madeira, uma prateleira de cd's e quase 500 livros...
Que me desculpem todos mas é bom variar da habitual nota negra delicodoce...

\me on Cabaret of Desire.

Saturday, February 17, 2007

Crazy Indian Music Video

Acho que só vou conseguir parar de rir lá para as 22 horas...

Friday, February 16, 2007

Palavras Proscritas

Dá-me a tua melhor faca, para cortarmos isto em dois...


Falar do inominado é usar as palavras como o coração impele o sangue através do corpo, extravasando a pele, a mesma pele que arde a cada segundo que passa, que se faz chama porque quer queimar-me a mim e comigo a mais simples memória de ti.
São as 3 chagas no meu corpo que mostro ao espelho sem as saber ocultar, são os 3 pontos que conto de cada vez que a minha mão tapa um sol demasiado inclemente, são as 3 pegadas que deixei na areia rumo ao mar que me tragou e devolveu inteiro, por saber que aquela água já tinha percorrido os nossos corpos, já tinha corrido fria, tão fria como a neve que ambos amparávamos à distância de um mundo sabendo que o universo que tinhamos que transpor estava à distância de um toque que ousasse ultrapassar cada instante e desvendar o sentido oculto das coisas.
O inominado são as perdas, aquelas que o tempo mais valoriza, aquelas cujo tempo não cumpriu ou se encarregou de destruir antes que este se concretizasse com a explosão de um grito... um grito que fizesse de nós únos como um só bater de coração, uma só alma...
O inominado é o sangue que se vai perdendo algures, liberto da melhor parte de ti e de mim, é o que uma lágrima negada perdeu insignificante enquanto se lamentava pela perda de um outro que nunca chegou a existir. Estava alí tão perto, ao alcance de uma palavra, porque o sentia em mim, crescendo como uma ideia, alimentando-se de sonhos sabendo-os superados, sabendo-os nada em comparação com o que lhe negávamos.
Já não é o azul que vejo, meu amor, nas noites que passo à varanda pensando em nós, é essa outra cor arraçada, selvagem, essa cor que se cria onde o mar se junta ao céu, e que perdemos por desconhecer que esse mundo estava alí do outro lado do espelho, no jardim, sobre o banco, esperando por nós.
É esse o corpo que lamento e velo, mas não o meu! O meu foi dado, vendido sem comprador que o quisesse, e mais nada poderia dar que tivesse, tudo por essa vida... Nada não, porque haveria uma palavra para além do corpo, para além da alma... o sangue com que vendi a alma encheu-me os ouvidos com um silêncio impossivel. Nem na lingua dos gestos com que escrevia o nosso nome no ar (porque estava dentro do meu) eu soube falar, nem me soubes-te escutar.
Já não é o Azul, nem o tempo, não me cala o sangue ou a alma, o inominado, as palavras proscritas são as que neguei um dia, sem as poder repetir, e velam sobre mim, sobre os sonhos, e junto com elas estão 46 pessoas olhando para mim...

...e eu, sem saber olhar, para dentro delas...


A M.

Isto sim, é o que eu queria escrever.

Thursday, February 15, 2007

ET Phone Home

Não devo ser deste planeta...

Para mim Hemingway é um sacana pretencioso com uma líbido a bater no tecto, o Saramago é uma manobra de marketing, o Paulo Coelho faz literatura pastilha elástica, a Margarida Rebelo Pinto é uma ressabiada, e o Dan Brown inventou o ovo de colombo...
Não suporto ouvir U2 como não suporto ouvir o Toy, os Coldplay enjoam-me mais que uma viagem numa traineira, não suporto mais nenhuma música nova dos Xutos e estou fartinho de música brasileira...
Já agora 99% dos cafés em Portugal servem uma mistela intragável, detesto cães com uma intensidade inversamente proporcional ao seu tamanho, ainda me admiro como para tratar de alguma burocracia os prazos nos são dados em semanas mesmo que a repartição\loja do cidadão\faculdade esteja às moscas, queria esfaquear o Jorge Gabriel, acho que o coleguinha dele é uma fantasia sexual sénior, não tenho paciência nenhuma para ver o telejornal, não ocupo a minha mente com os 11 titulares das equipas do calcio, da 1ª league ou da liga e acho que as pessoas são feias, más, perversas, egotistas e arrogantes incluindo eu.


...não era bem isto que queria escrever...

Vou beber chá...

Wednesday, February 14, 2007

Dia de São Valentim...

... já comeste um coração hoje?

esta é rápida, que o benfica joga a seguir, um pouco à Arcebispo (ganda blog).

Monday, February 12, 2007

O Peso dos Dias

"Para todos os males há 2 remédios: o tempo e o silêncio." A. Dumas.


Os dias passam como cristais no nevoeiro. Hoje é o amanhã que tanto temíamos, o ontem é uma lembrança desconexa. Sei de cor os passos que me trazem até aqui, o movimento constante, e deixo marcos como passos, como pistas que me vão levar a algum lugar longe daqui.
Não me preocupam datas, nos vários tempos possíveis vivi sempre aquele mais pessoal, num ritmo próprio de quem respira sentimento e comoção. Vivi por isso dias como séculos, e acordei de uma noite dando conta que um ano já passara. Hoje a saudade marca o compasso dos meus dias, respirando por mim.
Como nunca o tempo expande-se nos segundos e prolonga-se nos dias que passam. A saudade afasta-me das coisas como um trilho incerto que se fecha sob os meus passos: desconheço o caminho que passou e, sobre alguns espaços onde estive, duvido se são sonhados ou concretos.
O tempo do sentimento é este no qual acordo entre realidades, contando segundos espaçados e desconhecendo como é possível passarem as horas por nós. Sabe a sal e a distância, sabe também, a dor e a saudade. Sabe ao circulo da minha mente, que me prega partidas atrasando o relógio por cada vez que não olho, sem nunca me sincronizar com o mundo.
O tempo não faz de mim mais sábio, ele corrói tudo, pessoas e montanhas por igual. Saberia que não estou melhor hoje do que estive ontem se não duvidasse da própria existência de um dia que precedeu este. Este tempo , não é o meu, é tão intangível como qualquer um desde o momento em que saíu de mim.
Apago as velas dos dias que conto num calendário que se refaz a cada instante, agarro-me a essa ideia de constância, de marca-passos, que me traça um caminho (não sei se sonhado ou real) no qual prefiro acreditar à falta de fé.
Agarro-me a cada pedra, fria, talhada, que se espalha nesta colina que se ergue diante de mim como a cada sentimento, e temo cada palavra que o contrarie porque depois de tudo perder nos aferramos aos sonhos que temos dos nosso próprios conceitos.
Há momentos que dividem tempo e espaço, que rasgam o seu tecido, e definem o seu controno embrulhando os dias com dúvidas e certezas, com emoções. Há momentos que não acontecem, são em si mesmos, um tempo.
O meu tempo é este, e não tenho palavras para ele, não tenho velas para os anos que passam, ou esperança com que lhe embrulhar as prendas... o meu tempo conta-se em culpa, dor e saudade, como ponteiros de mim para segundos, minutos e horas. Neste tempo já vivi uma vida mas nem tive tempo para respirar um segundo.

\me on Linda Martini, Amor Combate

Texto escrito 11/02/2007, revisto hoje.

Friday, February 09, 2007

Geração Rasca

Pertenço, já aqui o disse, com orgulho, à geração rasca.
Mas onde estamos hoje?
Olho para esta geração, conto os seus dias, aprendo as suas dúvidas e assalta-me este medo de não sermos um passo para a frente, mas o assumir de um egocentrismo cada vez mais autista que mais do que sentido é imposto.
Em geral, vejo esta geração como perdida, entre os dilemas de um curso superior que a melhoria económica fez obrigatório e um país de amadorismo em que mais do que ser inteligente, conta ser desenrascado.
Não nos libertamos do jugo fascista de salazar, a geração dos nossos pais, maioritariamente saída de um Portugal profundo, via Coimbra e os seus doutores, como garantia de sucesso, emprego fácil e remuneração satisfatória. Por isso trabalhava e enviou os seus filhos para as capitais de distrito, não se importando com o curso tirado mas com a certeza de um canudo final.
Pensava-se que a comunidade europeia que entrava a rodos neste país, maioritariamente sob a forma de subsídios, nos abriria as mentes, se o não conseguiria com os nossos pais, seguramente o faria com os seus filhos. Mentira. Entrados nesse mundo académico, e armados de um espírito retro, resgataram os trajes e preceitos de outros séculos, de capa e batina, distinguindo-se ou querendo distinguir-se da turba por ordem sociais intrincadas, que fizeram das faculdades um sistema de castas regido por festas, álcool, drogas, sexo e facilidades.
Estudantes que cresceram num país governado por incompetentes, que prescindiram da qualidade para estabelecer um sistema de ensino que produzisse aprovados em sintonia com médias europeias, e que no final descobriram que anos e anos de "passar para não dar muita papelada a preencher" era um mundo de Oz que nada tinha a ver com o que se passaria depois.
As faculdades encheram-se destes filhos dos nossos pais, aos milhares, entrando como os melhores da europa em medicina e os piores da europa em geografia.
Agora que já saíram, ou começam a sair, descobrem um país que vai pagando o desgoverno de sucessivos governos, que se vai degenerando e endividando, sem um qualquer propósito final. O melhor, está guardado para o fim, descobrem que este país dispensa canudos por falta de trabalhadores ou pelo seu excesso, descobrem que as empresas preferem produzir sapatos a computadores, descobrem que o mérito vale menos que os amigos do teu pai.
Descobrem no fundo, que este país continua a ser de faz de conta, onde o que deveria ser feito não o é, antes se remedeia com um genérico de má fama, antes se remedeia com um jeitoso, que faz as coisas em cima do joelho mas que até leva mais barato.´
A Geração Rasca trabalha numa caixa de supermercado, quando não o acham demasiado qualificado para esse trabalho, e então fica desempregado. Ou então, descobre que a responsabilidade e o saber fazer que lhe provém de 4 ou 5 anos perdidos é paga com o ordenado mínimo ou pouco mais, olhando para os seus colegas "em profissões menos qualificadas" ganhando o dobro ou o triplo pelo menos desde os 16 anos, quando deixaram o 7º ano por adivinharem que alí não havia futuro.
A Geração Rasca, desespera, quem tem cabeça sai daqui mesmo que o engenheiro lhes prometa que está em curso uma maravilha económica da qual ninguém se apercebe. A Geração Rasca, é gente desalinhada, que já não acredita no futuro, porque lho roubaram. A Geração Rasca, são as vitimas de um amanhã, que não previram ou prepararam, deslumbrados por um mundo que se mostra impiedoso com o facilitismo social.

Depois de mais uma apreensão de material contrafeito, numa dessas feiras de Portugal, gracejava com um colega, por este ser um país de contrafacção. Dizia-me ele, que o futuro de Portugal estaría aí, a nossa codificação genética que nos torna ases do desenrancanço, faria com que nós fossemos pioneiros na introdução de uma contrafacção geral. Contrafacção de roupa, ténis, perfumes, comida... e porquê parar por aí? Portugal vai conseguir que os seus habitantes, bebam água contrafeita, uma espécie de água que não é bem água mas outra coisa qualquer, tipo retiraram-lhe um átomo de hidrogénio ou assim...

Boas novidades a todos, já chegamos aí, vivemos sim, num país contrafeito.

Wednesday, February 07, 2007

A fome.

And I suppose that's the price you pay...

A fome como ideia de tudo abarcar, de tudo comer, de tragar o mundo de uma só dentada e deixar dele apenas migalhas espalhadas pelo universo enorme, com pouca vontade de as apanhar, vou varrer para debaixo do tapete...
É a fome dos dias, daqueles que passam e dos outros que ainda estão por vir.
Há pessoas que falam de amor e coisas boas, quem coma chocolate embrulhado em papéis encarnados, há quem faça recheios e seja vegetariano, há quem passe por ti, quem engane a fome mastigando-te a ti na mordomia dos dias, como quem masca um pedaço de tabaco.
Prefiro o ódio e a ganãncia, a falência dos sistemas, das pessoas, dos sonhos e dos animais, o meu sonho é comprar todos os aerossóis do mundo para aspergir no alasca, eu quero ver no ozono um buraco. Atrai-me mais a inveja e a arrogância, sou daqueles que espanca cachorrinhos e esmaga pintainhos com as suas botas de metal.
No mundo das flores e do sol prefiro os guarda-chuvas e os para-raios, prefiro o deserto de betão e o fumo do cigarro. Prefiro podar o special x, e lamber conscientemente as mortalhas, adoro os fogos, as beatas e os cinzeiros encardidos...
No passar dos dias, entre a barba crescida e o dedo que amarelece segurando um cigarro, não me interessam os dramas que contam, os processos de melhoria, as evoluções e crescimentos, o caminho da luz. Os sorrisos enjoam-me, como me enjoam os toques, os beijos, os abraços e as palmadinhas nas costas de hipócritas profissionais.
Ninguém me atravesse caminho quando me molho na chuva, ninguém me dê a mão ou prometa o futuro, não quero ver o benfica campeão, não pedi nenhuma prenda, não pedi nenhuma sorte, não quero o euromilhões eu nem sequer jogo.
Mas que caralho de mundo é este que quer gente conformada que sorri, se eu for antisocial isso faz de mim um inadaptado? Mas que é esta merda é esta, que felicidade todos temos de perseguir, que futuro temos de abarcar, quantos filhos temos de ter, quantas vezes temos de foder, quantos talhos devemos fazer na cabeceira da cama por cada mulher que lá passa e se entrega por ser ou querer ser feliz, ou realizada, é amor que prometemos?
Eu não quero sorrir todos os dias, eu não me tenho que obrigar a gostar, não faço nada do que me pedem nem quero fazer, não quero ficar calado.
Mas porque é que ninguém sabe escutar o silêncio e prefere ocupar os interlúdios com palavras, com perguntas, com essa verborreia mental e verbal que me enjoa. O meu herói será aquele que for capaz de se calar!
Será dos dias que correm?

Distorções ao som de arctic monkeys e Lisbon Revisited de Álvaro de Campos (?)

Monday, February 05, 2007

Fisica & Alma

O corpo humano é regido pela física.

Todos os objectos são imbuídos de uma estrutura que é deformável por forças externas. Essa deformação é elástica quando a força que provoca a deformação cessa o objecto retoma a forma original, a deformação é plástica quando a força que provoca a deformação cessa o objecto deforma-se e não retoma à forma original. Ultrapassado o limite plástico ocorre a ruptura do objecto. A intensidade, a direcção e o tempo da força são variáveis que influem nos limites mencionados. O aumento de intensidade da força corresponde às transições entre estados. Os objectos oferecem geralmente resistências diferentes conforme são esticados ou encolhidos, isto é, se variarmos a direcção da força, devido a não serem homogéneos. Uma força prolongada no tempo provoca um efeito cumulativo, por exemplo, se um objecto for colocado na sua fase plástica e se a força deformadora se mantiver, este entrará na sua fase plástica.

O alongamento muscular obedece a estas leis. Um musculo só é convenientemente alongado se este for alongado ao longo do seu eixo de movimento (direcção), com uma força suficiente (intensidade) para este entrar na sua fase plástica durante um tempo determinado que iniba o reflexo de alongamento (um reflexo semelhante à contracção muscular que se observa quando levamos com o martelo no joelho) e faça persistir a força.

De um modo análogo, o alongamento das nossas expectativas, resistências, desejos e sentimentos, tudo o que se passa dentro do nosso crâneo só acontece quando as forças externas agem sobre nós na direcção certa, com a intensidade correcta, pelo tempo determinado.
Quantos mais velhos somos, mais as nossas convicções se acham laxas pelo desgaste dos anos, envelhecer (ou crescer) é perder as certezas absolutas.
Quanto mais os stresses do dia-a-dia são fortes, ou nos atingem por terem uma determinada direcção, por nos tocarem em pontos sensiveis, mais depressa envelhecemos (ou crescemos) mais depressa a nossa mente caminha para um alongamento crescente capaz de albergar um mundo maior e um maior mundo.



Os sistemas dinâmicos reagem por sobreposição a interferências externas. O fortalecimento muscular baseia-se entre outras no princípio da reacção à sobrecarga. Todo o nosso corpo funciona assim, quando sujeito a uma força externa que o força para além dos seus limites, a primeira reacção é a destruição celular e a inflamação, quando a força cessa e se dá tempo à recuperação, esta passa por uma reacção exagerada do organismo que sobrecompensa a agressão. Por exemplo os calos na nossa pele, são resultado de um contacto externo que primeiramente destrói a nossa pele, secundariamente a nossa pele reage em "exagero" criando uma aglomeração celular que é mais densa que a anterior, surgindo o calo.
O fortalecimento muscular, segue o mesmo percurso. Os músculos sendo submetidos a uma sobrecarga (i.e. uma carga superior ao normal) são parcialmente destruídos e inflamam. A recuperação que se segue provoca uma proliferação celular reconstrutora, que aumenta a capacidade muscular (grosso modo).

Mais uma vez, aquilo que se passa no nosso crâneo é análogo. Quando sujeito a uma sobrecarga, o nosso cérebro reage por sobrecompensação, tornando-nos mais fortes, mais aptos a reagirmos a cargas maiores. Envelhecer (ou crescer) também é capaz de ser isto.


Será que o nosso cérebro, personalidade ou alma, também têm um ponto de ruptura, ou então, por sobrecarga excessiva se fecham sobre si mesmos e não recuperam mais?

Arctic Monkeys - Leave Before the Lights Come On

Feeling like that lately...

Friday, February 02, 2007

Um exercício simples.


Proponho que as seguintes instituições se sentem no banco dos réus, no tribunal internacional de justiça (em Haia):


Papa & Cúria:

Artigo 3º - Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Pela sua posição assassina sobre o uso do preservativo.

Artigo 1º - Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

Pela sua posição vergonhosa sobre as opções sexuais, incluindo mas não se limitando à saúde reprodutiva, planeamento familiar e orientação sexual.


Votantes do Não no próximo referendo:

Artigo 12º - Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei.

Por pretenderem impor por lei uma vontade que não deveria ser totalitária. Por pretenderem a condenação legal daquelas que pensam diferente. Por não confiarem na responsabilidade e livre arbítrio das mulheres portuguesas.


Organização Mundial do Comércio:

Artigo 25º - 1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade.

Por promoverem a liberalização mais selvagem, a ditadura económica e a chantagem financeira. Pela sua globalização de recursos e centralização de proveitos. Pela constante e selvática sobreposição dos ditames económicos sobre os mais elementares direitos e liberdades humanas.


Companhias farmacêuticas:

Artigo 5º - Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Por curarem as doenças do 1º mundo às custas do 3º. Por transferirem os prodecimentos do Dr. Mengelle para a Indía e para África. Por sujeitarem essas pessoas ao tratamento mais desumano e mais arbitrária tudo em nome de um progresso científico pago pela opulência hipócrita da Europa e dos EUA.


EUA:

Artigo 9º - Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.

Por Guantánamo e por todos os sítios onde trocam a dignidade humana por uma falsa sensação de segurança. Por fazerem perdurar a injustiça que dá à luz os mais perversos criminosos da actualidade.


Estado Português:

Artigo 23º - 1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego.

Pelos 500000 desempregad@s neste país. Pelo desiquilibrio das relações contratuais.