Thursday, February 24, 2011

la chispa adequada

esquirlas de aire
arcano indescifrable
en el jardín de mis delicias
pertenezco a la brisa
inhalo la niebla
que flota en el ganges
el aceite de incienso
nos servirá de consuelo
dizes "há uma resposta em algum sítio"
e eu tento encontra-la em qualquer sítio, em qualquer tempo que seja
seja nestas paredes núas, seja nas noites que passo sentado numa tijoleira fria
seja agarrado a um cigarro
ou em todos os dias que maldigo as qualidades todas que me apontam, mas que nunca chegam para me aproximar do que quero
haverá uma resposta
enquanto tremo de frio
há sempre uma resposta
mas não aprendemos a substituir "resposta" por "verdade"
sonhamos apenas que significam a mesma coisa, quando na realidade estão tão distantes como um arquipélago de ilhas
dizes ainda que as "respostas" têm esta forma, e eu não disputo
são feitas de palavras, de imagens claras
são aquilo que sucede a um igual após a soma das partes, uma função soberana
as respostas são redondas, ou quadradas
cabem em prateleiras ou pertencem a boiões de vidro
podemos até colocar-lhes etiquetas, e porque não? recicla-las depois do seu uso estar concluido
nas respostas colocamos pontos finais
será que me pedes o mesmo neste espaço entre nós?
se nele só vejo reticências e alguns centímetros até à tua pele?
serão respostas que se encontram entre nós, ou apenas um espaço vazio
será que o preenchemos com coisas
ou será que não nos importa assim tanto o silêncio
será que queremos respostas?
eu estou farto de respostas
são demais as noites perdidas que gastei na sua procura
agora
resta-me apenas encontrar a verdade
e não me importa de a sustentar apenas nos átomos que separam os nossos olhos brilhantes
pode ser tão irreal quanto eu, pode ser feita da mesma matéria que os meus sonhos
mas se à coisa que eu descobri contigo
sendo a mais valiosa lição
é que atravessar este espaço na tua direcção, não me trará respostas, apenas mais dúvidas
mas por cada centímetro que passa
é mais uma milha que queimo das pontes que deixo para trás...

porquê?

Monday, February 21, 2011

despair in the departure lounge

Vou àquele espaço demasiadas vezes
tantas que parece que fico mais pequeno a cada vez que entro
será pelo tecto alto ou pela mesa de madeira à nossa frente
ou pelo facto de simplesmente não me deixarem fumar alí
o certo é que a cada passo o meu coração acelera e a minha visão se turva...
Apontas para a cadeira que está em frente de ti, não me dás hipótese de escolher (por acaso não foi sempre assim entre nós?), acolho-a porque na verdade também me restam muito poucas forças para me manter em pé e peço um café bem quente ao empregado soturno que me aguarda para além do balcão
das primeiras vezes, ainda olhava para ti de frente desafiante
pedindo do alto da minha vulnerabilidade para que por fim me perguntasses porque é que contigo agia de forma diferente
talvez por saberes que o esperavas nunca fizeste essa pergunta
e deixaste que lentamente o meu olhar descesse sobre a mesa para se deter em miradas longas sobre a brilhante colher que repousava na minha chávena já vazia
nessa altura suspirava
desejava até que tudo fosse diferente
que tivesse em mim a força para dizer não e romper o ciclo
mas nada acontecia nos intervalos de silêncio que ocupavam a maior parte do nosso tempo
nem eu me decidia a partir
nem tu me deixavas ficar
pendia do tecto como uma daquelas teias de aranha agitada pelo vento
às vezes trazia uma caneta e um papel comigo, ficava a rabiscar coisas no canto da folha, deixando sempre o mesmo espaço em branco como se nele quisesse escrever
uma vez tocaste na folha com o teu dedo, deslizaste a tua pele sobre as linhas como se a minha mensagem estivesse gravada em Braille e só assim a pudesses decifrar
se entendeste a mensagem, nunca o soube
sorriste, mas afinal, sorrias muitas vezes, mas isso nunca nos aproximou...
outras vezes virava a cabeça para a janela e fazia de conta que não estavas
ficava a entrever a paisagem entre as pessoas que passavam ou que paravam por ali
mas a mensagem que passava era sempre que se não fosses tu, sentada do outro lado da mesa, aquilo não fazia o menor sentido
e não fazendo sentido podia desaparecer de repente, deixando-me a mim pendurado, entre duas terras distantes, sem possibilidade ou bilhete de regresso a qualquer uma delas
não era inevitável e ambos o sabíamos
mas era preferível
como uma sub-estação de metro onde aguardávamos uma composição para melhor sítio
eventualmente uma intersecção entre duas linhas marcadas a cores diferentes no mapa
se me toleravas no mesmo banco é porque sabias que não me restava dinheiro para o bilhete de ida... e já há muito tinha abandonado a esperança de voltar para minha casa
enquanto a voz roufenha não se fazia anunciar no altavoz, ficávamos por ali a brincar ao que poderia ter sido se fosse ou ao como seria se acontecesse
nos piores dias chovia
atrasavas-te sempre nesses dias e por curioso que te possa parecer, o sentimento que se apoderava de mim era uma terrível solidão
ficava sempre na mesma mesa a um canto, encostado ao vidro, sentindo as gotas a bater contra o vidro e o frio a tomar conta de mim
chegavas sempre no momento limite, naquela nesga de tempo em que me deixava convencer que já tinhas partido e que as minhas tardes naquele café seriam sempre solitárias
mas afinal aparecias, em frente ao meu sorriso atónito e o meu aperto de mãos
ficava sempre sem jeito
enganava-me no pedido, nos trocos, na empregada que me devia atender
ficava até ao fim com a certeza que queria ter feito muito mais do que o que fiz
com a certeza que valia muito mais do que o que mostrei
mas o dia já tinha passado e amanhã... bem... amanhã... poderia tão bem ser um dia de sol como outro dia de chuva
o inevitável era apenas um lugar vazio para mim, outro para ti, e a minha vontade em estar noutro sítio...

Tuesday, February 15, 2011

ascend to oblivion

Afinal, de onde te vem o ódio...
Perguntou ela, de cigarro na mão
... das tuas memórias, ou desse lugar profundo que sabes esconder em ti?

não precisava de resposta pois não?
era como um evento desgarrado na linha da vida
uma pequena arritmia maligna a precisar de digitálicos
ainda debatemos a cura durante os dias, ainda enumeramos as inúmeras acções que tomamos para inverter o curso certo que nos conduziria alí, não havia afinal nada a fazer, o nosso local era aquele e não outro e encontraríamos sempre por ali aquilo de que fugiamos o resto do tempo
ainda há tempo, há sempre tempo por aqui, mas como areia numa ampulheta, arranja sempre espaço para escapar entre as frestas que abrimos entre nós
serão as memórias que as unem, como cicatrizes feias de combate
como medalhas de uma guerra que sabemos perdida e que levou com ela os melhores anos da nossa vida
são as memórias que fazem destes dias um tapete contínuo, incapaz de permitir a passagem do tempo para o esquecimento, fermentando na sua essência o ódio que me permite aguentar
aguentar que o tempo se detenha
como um pôr-do-sol em Havana ou em Paris
os lugares comuns sempre fizeram de nós fracos, mas ainda assim sempre cedemos às nossas vontades como se a nossa vida fosse apenas uma mentira, e todos os testemunhas dela um simples cenário de uma peça de teatro trágico-cómico
como nos poderíamos rir do que passamos, se não tivesse acontecido connosco
poderíamos rir até rebolar no chão, e ainda assim seria preferível a esta inevitabilidade de perguntas, que crescem no ar como o fumo do cigarro
somos duas pessoas sentadas, diante uma da outra, em cadeiras de madeira, sobre um tapete negro, escutando o relógio bater, procurando a alquimia certa de palavras que nos traga paz
porque indubitavelmente sei, nos interstícios da minha loucura, que por muito que fujas não te vais conseguir esconder
ainda é uma gaiola dourada o que te cerca, apenas aprendeste ao longo do tempo a adorar as barras que antes temias
e poderás dizer, porque não anda longe da verdade, que fui eu que te ensinei a adorá-las
por isso não me perguntes porque é que odeio
porque é que a superfície do meu lago é negra e todas as noites sonho em submergir-te nela para com isso te matar
já conheci toda a forma de vítimas e com cada uma delas aprendi apenas a morrer mais um bocadinho
porque é que odeio?
Será essa mesma a pergunta certa?
Porque estou cheio de mim, como uma barragem transborda
só quero apagar as margens e fazer parte do rio
odiar é um conforto por estes dias, como um instinto de sobrevivência primordial que se activa para nos manter vivos
não à esperança
a minha vida vai terminar como começou
comigo agarrado à letra L.

Sunday, February 13, 2011

Littmann

I'll keep fighting jealousy
'till it's fucking gone

O meu prazer não está em segurar contra ti esta peça
este pedaço de metal contra o teu peito nú
Está em segurar-te ao colo enquanto o faço, sentir através do corpo o teu coração acelerado e na minha nuca o teu respirar húmido e quente
está nesse pequeno abraço que trocamos a troco de nada, está nessa vontade em esconder-te de todo o mal sabendo que o teu futuro está para além dos meus sonhos, está nestes instantes que nunca recordarás
sou um sonhador (digo-te ao ouvido) e já fiz tantos quadros como há estrelas no céu (continuo) não sei o que desejas para o futuro (e aqui susurro), mas que estejas dele mais perto do que eu alguma vez estive (termino).
no seguinte instante, estás no colchão
e a mim resta-me a solidão que empunho na minha mão
está frio, eu sei, por favor não chores por isto
sabes que por muito que o segure de encontro a mim, há pouco calor que sobre para nos aquecer aos dois
suporta
são instantes, tudo desaparece quando seguras quem amas, tempo suficiente para esquecer o mundo lá fora
tal e qual eu imagino
tal e qual eu sonho durante a noite
vês
desaparece
desaparece, tal e qual eu desapareço da tua vida, da tua lista de prioridades
não sei para onde foi
talvez para onde todas as coisas vão quando as odiamos
e esse
deixa que te diga, porque ainda és muito nova para entender,
é um poço sem fundo
cabem lá tantas coisas boas...como coisas más
como todas as coisas que para lá empurro por saber que são demais, ou são impróprias, ou inconvenientes, ou desnecessárias
as coisas
são as coisas que nos roubam, no fundo, os sonhos, e a vontade de uma vida melhor
são, na sua grande maioria, coisas que não podemos dar, ou que outro dará mais facilmente
restando as outras coisas
pequenas coisas
que não fazem grande diferença no quadro geral
já te disse, que sonho muito?
conto-te enquanto choras (deus, guia a minha mão para que tudo isto seja curto e termine depressa)
sonho com coisas que queria fazer
sonho com uma pessoa especial
sonho e é isso que me mantém acordado à noite
tecendo um tapete contínuo com o qual desdobrar o futuro
sonho, no fundo, com ela
e nas várias maneiras com as quais a queria fazer feliz
alto
se esta é uma sibilância polifónica expiratória, sei que isto está perto do fim
só mais umas coisas à mão da minha colega
e poderás comer uma bolacha maria resingando sobre o que te fizeram aqui
talvez eu termine por aqui
termino sempre, um pouco como aqui
rendido aos factos de ser o último de uma lista demasiado longa
ou incapaz de realçar por méritos próprios, aquilo que desejaste para ti
andamos todos um pouco enganados
(ou então sou eu)
rendidos a promessas, ou a exotismos, ou a lugares comuns
prodígios de forma e vazios de conteúdo
ofereço o contrário
e é por isso nada
ou são noites solitárias agarradas a sonhos, ou a promessas, ou realidades mostradas por outros como epifanias de que o mundo não é este lugar feio que eu pinto
se erro?
sim
mas como ao estetoscópio acoplo relatórios e transformações rápidas de fourier
acoplo a mim, tentar de novo
como um anexo de um mail que deixamos por abrir na nossa caixa de correio por se situar um pouco acima da nossa lista de spams
e eu já te disse que não, a fazer parte de uma lista serei sempre aquele que fica em último lugar
terminamos aqui
deixa que a tua mãe te vista a roupa e te aconchegue no carro
já não precisas de chorar mais
nunca mais vais chorar, se dependesse de mim
mas todos os caminhos divergem, assim como o nosso
somos de mundos diferentes, e as pontes que faço
sejam feitas nesta relíquia de som ou em poeira
não resistem à mais pequena brisa
seja aquela que começa quando o carro arranca e te leva para longe de mim
seja aquela que termina quando as luzes se acendem e o cinema esvazia...

lembro-te (porque de mim não guardas memórias) e quero o melhor para ti
havendo equilíbrio no mundo, que se faça à minha custa... e não à tua

Sunday, February 06, 2011

the man who sold the world...

...mas esta noite, como nenhuma outra, faz-me falta escrever-te
escrever-te como uma catarse de todo o espaço impossível que existe entre nós
escrever-te com toda esta distância de bytes e caracteres, uma fonte contínua que tomara não acabasse, e lhe restasse apenas preencher os poucos centimetros que nos separam.
e ainda assim, porque nada mais podemos ser do que espectadores, mergulhados numa plateia escura e assoberbados por sons, distanciados por metros de um ecrã demasiado grande, seremos nada mais que espectadores, desejando, ou não, mergulhar numa tela e ser eternos assim...
e ainda se num sonho o pudessemos ser, se porventura o nosso maior desejo se realizasse e a invadissemos  através da luz que rasga uma atmosfera densa e carregada de pó, será que comigo poderia trazer o que mais quero, aquilo que mais desejo daqui?
será que para além das luzes e das sombras, uma tela conserva cheiros? será que cada movimento que capto com o canto do olho se transforma nas minhas memórias em notas olfativas, para que de certa forma te possa lembrar à noite, depois de todas as luzes apagadas?
entre sorrisos, a minha vitória aguardará no fundo de um copo de um vinho maduro, entornado à pressa por uma mão que procura o telemóvel ou que simplesmente se agarra a umas quantas teclas para poder viver um pouco de novo, entre sorrisos e fórmulas indeléveis, como indelevelmente o tempo se escapa por entre os meus dedos querendo eu agarrálo bem nunca o deixando partir para a terra das memórias, para a terra das promessas, para a terra, enfim, das vontades, aquelas mesmas que se partem em qualquer aresta real...
e entre sorrisos prometo, ou procuro promessas, que a distância que realmente nos separa é a desta noite e pode ser transposta por vontade, basta-lhe que os dedos se estendam à procura do que sempre quiseram e te procurem no meio daquela noite, basta-lhe que os sonhos sejam tão palpáveis quanto nós e tão vívidos como o vermelho das tuas unhas...
e ainda assim só conseguem ser tão discretos como os momentos em que me esqueço do que estou a fazer ali e me perco, por breves instantes, na única verdade que torna tudo o resto opaco e insosso
são discretos porque são como esta noite... quando o filme termina e a luz ilumina de novo, sabemos ambos que os nossos caminhos divergem, rumo a mundos distantes, cujas pontes sobrevivem apenas apoiadas na poeira que o raio de luz do projector consegue iluminar...