Friday, April 09, 2010

Paranoid Android

Sou como um fantasma a passar no meio deles.
O meu olhar só se crava na sua nuca, mas não se cruza com nenhum outro, perde-se contra as paredes ou contra as luzes de halogéneo que sobressaem do tecto.
Sou como um fantasma porque não pertenço àquele espaço, expulsaram-me pelos sacrifícios que não sei fazer, pelas palavras que deveria ter dito e não disse, ou pela conveniência de quem se pacifica com pouco.
Estou no meio deles e ainda assim estou longe, desloco-me para outro espaço que antes me parecia especial porque era meu, ou porque nele se guardavam velhas relíquias cobertas de pó. Hoje elas vendem-se ou trocam-se no mercado por um punhado de feijões mágicos. Ficou foi por inventar a terra onde, se plantados, cresceriam até ao céu.
Reservam-me para mim, fantasma, um lugar afastado do centro, paradigma da trajectória elíptica e centrífuga que me expulsa deste lugar. No centro deste universo morre o sol e com ele desvanece-se a última réstia de luz e a última centelha de calor. Os planetas ficam pálidos e frios, neles não cresce vida e no entanto perduram na sua órbita fixa por uma rotina que já esqueceu que naqueles mundos já existiu um sol. E quando o sol explode para dar lugar a uma anã branca sinónimo do nível pelo qual se mede toda a qualidade aqui, afasta-me cada vez mais do meu destino negando-me que alguma vez tenha sido o meu, a sua explosão em fogo, sinónimo de morte abre outras portas e outros destinas enquanto inevitavelmente encerra o meu.
E não lhe importa que em mim resida a esperança, ou pelo menos o desejo de acender de novo esta luz. Não lhe importa que em mim haja ainda uma centelha pronta a pegar fogo a uma estepe demasiado ressequida pela indiferença. A esfinge que guarda este mundo há muito que não se move por compaixão ou piedade.
Eu sou uma centelha de vida que arde num interior de um fantasma.
Sou a primavera adiada depois de um inverno tão longo.
E vão retorquir como de costume que me move o desejo, ou o orgulho, ou crença cega numa boa estrela que parece ter ido de vez quando a destinei a velar por alguém num impulso abnegado que mais uma vez se disfarça de desejo.
E dizem que o meu desejo é impossível ou mais uma vez adiado.
Dizem que o meu desejo é como uma bola colorida que embate nos painéis de madeira da roleta que eles fazem girar.
Dizem, ainda, que quer apostando 1 conto de réis ou a vida, é igual, será sempre a sorte a decidir em que casa paro.
Mas não sabem que para mim, ou por ser fantasma ou por ver simplesmente mais longe, a recompensa nunca vai pagar a aposta, e ainda assim a desejo, desejo-a enquanto explode um sol e todos os mundos se queimam... desejo-a enquanto os outros decidem que o sol "já não faz falta brilhar"...

this is what you get
this is what you get
this is what you get
when you mess with us
karma police

2 Crossroads:

Blogger Different said...

O mentacutilante mudou de casa: http://acutilantemente.blogspot.com/
Brevemente darei um novo alento ao cantinho.
Bons posts e boas leituras,
Different

E o circo? mudou de sítio ou deixou de fazer sentido?!

5:55 PM  
Blogger Daniel C. said...

Vou voltar a frequentar o espaço então... esperando pelo regresso.

O circo... quando o espectáculo acaba, a única coisa que resta mesmo é a porta de saída e claro o caminho... de volta...

bj

10:47 PM  

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