Tuesday, December 19, 2006

Room 101


Já não sei, ou melhor, não sei se algum dia soube, se as direcções se aplicam quando não existe um destino comum.
Não me interpretem mal, já perdi a conta às vezes que me perdi por prazer em paisagens urbanas ou idílios rurais.
É mais aquela certeza de um destino concreto quando nos sentimos a mover.
São os silêncios, sabes? Os silêncios da alma quando sabemos que ninguém escuta, nem mesmo nós próprios, nem mesmo a nossa sombra.
Nem sequer se trata do medo... porque o segredo reside em ultrapassá-lo, quando já nada tens a perder, isso sim é um ponto sem retorno para o significado.
Não precisas de ver o aço ou a madeira, não vão ser vidros a cortar a tua pele, ou pedaços de couro a rasgar a tua carne, a subjugar a tua vontade... não, tu só és escravo de ti mesmo, e se não ris é porque desconheces a ironia.
É apenas a cadeira e uma mesa, numa habitação vazia, perto do céu que um dia julgaste mais próximo num refúgio perdido nesta cidade submersa.
É uma porta diante de ti, que esperas que abram.
E então reconheces o que sempre soubeste, porque duvidaste de que eles saberiam?
Não são armas, nem venenos, nem poções mágicas, ou instrumentos, se destilares uma gota do teu sangue achas essência que baste para te matar mil vezes.
Duvidas então que eles abram a jaula, confias, fazes parte do projecto.
Mas quando menos esperas, eles vão abrir a jaula, e formulas as palavras que desconhecias existirem dentro de ti.
Não te admires, não são grandes palavras, nem é, contrariamente ao que pensarias, o discurso que tinhas ensaiado. É claro que não os surpreendes, nem a eles, nem a ti.
São apenas 4 palavras, dificilmente são mais, e não ecoam, ou saem do quarto 101, se as escutas, escuta-las dentro de ti.
E então percebes, são as palavras que roubam o sentido à bala onde se inscreve o teu nome.
Porque não duvidas, sabes que ela te aguarda no fundo do corredor enquanto caminhas de costas para não ver o relâmpago.
Não sabes se tarda, ou se se apressa na manhã seguinte em que acordas ao som do que falavas.
Sabes que vem. Não sabes mais nada.
E não está ali no corpo que estragaram, ou na vida que te tiraram, não está no cadáver de ti que te fita no espelho, não se trata de dor, mas de indiferença.
Eles sabem, eles sempre souberam, apenas tu é que não.
Não é o que temias nas noites solitárias, ou nos caminhos intermináveis, ou nos olhares que se cruzavam com o teu, nunca foi isso.
É apenas o que carregavas, como um erro impresso em ti.
Não são palavras que te ferem, mas sim a sua ausência.
Não são emoções, mas a falta delas.
Não é a ironia, nem a revolta, tu morres pela esperança.
Quando essa luz branca se apaga e a realidade te cega...
Eles não matam a esperança, tu sim.

Tudo no quarto 101.

/me on massive attack

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