Libendai
Sem voz.
Estávamos ambos naquele café.
Tu a tagarelar enquanto bebias a tua chávena de chá e eu fumando cigarro atrás de cigarro tentando-me esconder por entre o fumo que este fazia, como se quisesse ou pudesse estar noutro lado qualquer longe dali.
Vamos rasgando, entre palavras, o papel de parede que existe entre nós. Como duas divisões da mesma casa que se desconhecem entre si.
Do que cada um falava não importava. De facto, como sempre, estávamos mais entretidos a ouvir-mo-nos a nós mesmos do que a ouvir quem estava ali mesmo à frente de nós. Já era assim há muito tempo, era-nos mais útil de certa forma representar o papel que tinhamos imaginado do que nos darmos ao trabalho de apenas nos sentarmos na plateia, um por entre muitos como sempre odiamos, a ver representar o outro.
Aquele era mais um capítulo do mesmo conto de sombras com que cozinhávamos o nosso ódio em lume brando desde que matamos o nosso filho afogando-no na lama que transbordava da nossa própria desilusão.
De certa forma mantínhamos o rito, como nos mantínhamos à tona nos dias que passavam, por mero instinto de sobrevivência, por ordens invisíveis que partiam do nosso cérebro e que nos obrigavam a respirar mesmo que não restasse em nós qualquer vontade de continuar.
O meu discurso desconexo fazia por penetrar numa concha de indiferença que espalhavas em direcção à mesa onde as nossas chávenas repousavam, quanto mais as palavras faziam por se desiquilibrar na ténue corda onde caminhavam mais o teu sorriso as empurrava de novo na direcção certa, em direcção à corda. Ao mesmo tempo, corda de segurança e cama de rede para elas e eu gastando os últimos cartuchos do amor que me restava para tentar alcançar o pequeno espaço vazio situado entre uma e outra.
Mas se nem tu me deixaste cair, nem eu teria a coragem para arriscar empurrar-te contra uma parede para ver se ela resistiria ao teu impacto ou se cederia, como tudo cedia ao teu encanto, se nele colocasses um pouco do teu esforço.
"Não sou coisa nem nada..."
Estávamos ambos naquele café.
Tu a tagarelar enquanto bebias a tua chávena de chá e eu fumando cigarro atrás de cigarro tentando-me esconder por entre o fumo que este fazia, como se quisesse ou pudesse estar noutro lado qualquer longe dali.
Vamos rasgando, entre palavras, o papel de parede que existe entre nós. Como duas divisões da mesma casa que se desconhecem entre si.
Do que cada um falava não importava. De facto, como sempre, estávamos mais entretidos a ouvir-mo-nos a nós mesmos do que a ouvir quem estava ali mesmo à frente de nós. Já era assim há muito tempo, era-nos mais útil de certa forma representar o papel que tinhamos imaginado do que nos darmos ao trabalho de apenas nos sentarmos na plateia, um por entre muitos como sempre odiamos, a ver representar o outro.
Aquele era mais um capítulo do mesmo conto de sombras com que cozinhávamos o nosso ódio em lume brando desde que matamos o nosso filho afogando-no na lama que transbordava da nossa própria desilusão.
De certa forma mantínhamos o rito, como nos mantínhamos à tona nos dias que passavam, por mero instinto de sobrevivência, por ordens invisíveis que partiam do nosso cérebro e que nos obrigavam a respirar mesmo que não restasse em nós qualquer vontade de continuar.
O meu discurso desconexo fazia por penetrar numa concha de indiferença que espalhavas em direcção à mesa onde as nossas chávenas repousavam, quanto mais as palavras faziam por se desiquilibrar na ténue corda onde caminhavam mais o teu sorriso as empurrava de novo na direcção certa, em direcção à corda. Ao mesmo tempo, corda de segurança e cama de rede para elas e eu gastando os últimos cartuchos do amor que me restava para tentar alcançar o pequeno espaço vazio situado entre uma e outra.
Mas se nem tu me deixaste cair, nem eu teria a coragem para arriscar empurrar-te contra uma parede para ver se ela resistiria ao teu impacto ou se cederia, como tudo cedia ao teu encanto, se nele colocasses um pouco do teu esforço.
"Não sou coisa nem nada..."
Sublime, Daniel. Gosto de saber que continuas a escrever tao inspiradamente... espero-te bem! Beijo.
Barbara